Do Instinto à Inteligência | A Jornada da Evolução Humana

Sob o Domínio do Instinto

Sob o domínio do instinto, a manifestação mais primária da inteligência, o ser humano é governado por paixões avassaladoras. Com seus vícios, essas paixões o aprisionam nos níveis mais baixos da consciência. Atraído pelo desejo, elemento que regula a natureza inferior, o ser humano submete-se a viver no plano mais denso da vida. Ali, encontra nos prazeres sensoriais suas satisfações mais básicas e, frequentemente, viciosas. Neste patamar da existência, onde impera a ignorância, as experiências são invariavelmente as mais dolorosas.

A ignorância, então, é substituída por uma forte soberba, que sustenta uma verdade questionável sobre a vida, o destino e o progresso. Ainda que no mais profundo da alma desponte um sentimento puro — fruto do amor que germina em seu coração simbólico —, o ser humano resiste em aceitar que o fluxo da vida já contém o plano para seu progresso espiritual.

Isso ocorre não por uma decisão deliberada, mas pela persistente ignorância sobre as leis que regem tanto a evolução cósmica quanto a sua própria. Invariavelmente, quanto mais dominado pela ignorância, mais o ser humano se apega a uma pretensa sabedoria, afirmando possuir as chaves para a salvação da humanidade. Essa dinâmica é agravada pelo contexto das paixões, quase sempre alimentadas por doutrinas que formam opiniões e ditam comportamentos, sejam de natureza religiosa, ideológica, política ou outra.

Dominados por seus algozes internos, esses comportamentos tornam-no um escravo, quase incapaz de se libertar de suas paixões. Cria-se assim um círculo vicioso – os comportamentos derivam das paixões e, ao mesmo tempo, as intensificam. Nessa vastidão de ilusões, a humanidade caminha em um desvario coletivo, sem rumo, em direção a um abismo perigoso e desconhecido. À custa de muito sofrimento — resultante das más escolhas no exercício do livre-arbítrio —, o ser humano finalmente desperta pela dor. Inicia-se, então, a jornada do autoconhecimento, uma busca pela libertação da escravidão das paixões. O caminho é longo e exige esforço, persistência, paciência, disciplina e, acima de tudo, obediência ao impulso da centelha divina que habita sua essência mais profunda.

A Paixão Como Elemento Mobilizador do Progresso Humano

É preciso esclarecer que, ao mencionarmos os aspectos nocivos das paixões, não estamos afirmando que todas elas o sejam. A paixão é uma força que brota do instinto, e este, por sua vez, é uma parte essencial da inteligência primária. É essa inteligência que se mantém ativa, governando as leis básicas da vida – reprodução, conservação e destruição (transformação). A função primordial do instinto é, portanto, zelar por essas três leis em sua atuação direta sobre o corpo e suas necessidades básicas.

O repertório das paixões, contudo, amplia-se ao se unir às ambições motivadas pelos desejos. Um dos anseios mais prementes do ser humano é o progresso material, fundamental para estabelecer as bases do avanço intelectual. Este, por sua vez, contribui imensamente para o progresso espiritual, ainda que essa conexão seja muitas vezes questionada. A paixão é, portanto, uma força motriz acionada pelo desejo ou pela vontade, servindo tanto ao bem quanto ao mal. O desafio não é ser dominado por elas, mas sim saber usá-las como um poder de mobilização governado pela inteligência suprema, pelo amor e pela ética. Compreendida essa dupla natureza da paixão, podemos então explorar a jornada de sua transmutação – o caminho alquímico que a eleva de força bruta a sentimento sublime.

Das Paixões no Domínio do Instinto ao Amor no Plano da Inteligência

Despertando lentamente, como quem acorda do sono da noite, o ser humano mobiliza suas forças internas e eleva seu nível de consciência. Esse movimento ocorre sob o influxo da alma imortal, onde habita a centelha primordial do espírito. A força ígnea dessa centelha sempre esteve ativa, desde o domínio do instinto, e permanecerá assim por todo o desenvolvimento da inteligência suprema. O fogo serpentino foi aceso na base da consciência primária e sua chama se eleva pelos canais apropriados ao longo da coluna vertebral. Ele ascende até alcançar o nível mais elevado da consciência, no chacra supremo no topo da cabeça, onde ilumina a glândula pineal — a antena de conexão com os mundos superiores da espiritualidade.

O caminho entre o domínio do instinto e a plena inteligência é longo e fundamental. No entanto, esse percurso não implica a destruição do instinto, mas sim a sua preservação, mantendo suas funções originais. A mudança crucial é que ele deixa de reger as atitudes e os comportamentos, passando a atuar em obediência à inteligência suprema.  

Dessa maneira, as paixões são sutilizadas no amor e se convertem na força que emana da harmonia do ser integral. As sombras são, então, iluminadas pela luz primordial, pois foram retirados os obstáculos que a ela se interpunham – as atitudes e comportamentos derivados das paixões mórbidas que antes dominavam a consciência. A libertação vem à custa de muito esforço, mas é compensada pela paz de espírito, que se revela como a primeira e verdadeira experiência de felicidade. Essa paz recém-descoberta nos convida a reexaminar a fonte primária de nosso sofrimento – nossa relação com o mundo e com o que possuímos.

Do Apego no Domínio das Paixões ao Desapego no Usufruto dos Bens

A vida só pode ser uma experiência de felicidade plena quando o ser humano compreende que a causa de todo o seu sofrimento reside no apego que atribui aos seus bens, tanto materiais quanto emocionais. O desapego, porém, não significa desprezar os valores materiais da vida. O desprezo é uma ofensa a tudo o que o Criador de Tudo nos disponibilizou para o nosso progresso integral. É imperioso, portanto, saber o valor de cada coisa e usufruir dela adequadamente. Esse é o melhor sentido da vida – a jornada de autorrealização em busca da felicidade.

A felicidade não depende de fatores externos, embora reconheçamos que eles têm sua importância. Ela é um estado de paz interior alcançado pelo desapego através da resignação, o que nos possibilita lidar com todos os eventos da vida com igual serenidade e plena confiança nas leis supremas. Talvez a felicidade dependa mais do mínimo do que do máximo conforto. Afinal, o excesso de conforto pode se tornar uma tentação para abandonar o sacrifício resignativo, necessário para a elevação da consciência. Esse conforto não é um obstáculo intransponível, mas torna-se quase sempre uma provação difícil de ser superada.

O desapego ao conforto não pode ser entendido como desprezo por ele. O conforto é tão importante quanto o alimento, a saúde, o ar que respiramos e a própria paz interior. Contudo, ele deve ser uma conexão com a paz, e não uma “cama” onde a consciência repousa em uma inércia cômoda.

Não há mérito na pobreza que resulta do desleixo com os próprios talentos; isso seria apenas outra forma de desprezo pelos dons concedidos pelo Criador de Tudo. A equação a ser resolvida é, portanto, encontrar o equilíbrio que define o ser integral – a capacidade de viver em paz com o que temos, sem que nossa felicidade dependa disso ou de futuras conquistas. É nesse ponto que a gratidão se revela como a mais bela prece.   

A jornada da consciência humana, do instinto reativo à inteligência serena, é, em essência, uma longa e sublime pacificação. Nela, a força bruta da paixão não é aniquilada, mas refinada nas chamas do amor. O apego, raiz do sofrimento, cede lugar ao desapego grato, que nos permite usufruir da vida sem nos tornarmos seus prisioneiros. Não se trata de negar a matéria, mas de governá-la com sabedoria; não se trata de extinguir o desejo, mas de alinhá-lo ao propósito da alma. Assim, o ser humano encontra o seu lugar, não como um escravo de suas circunstâncias, mas como o maestro consciente de sua própria evolução, cuja sinfonia mais bela é a paz que brota da gratidão. Este é o caminho e o destino do ser que se descobre, finalmente, integral.

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