Somos “coisas” que não param de processar informações, mas que, paradoxalmente, não geram pensamentos próprios. Por definição, “coisas” são objetos não identificados ou não especificados. No entanto, somos “coisas” com identidade e personalidade, indivíduos que são “pensados”, com uma individuação frágil, agindo e se comportando por meio de estímulos condicionados.
Somos constantemente influenciados por formadores de opinião e por sistemas organizados na sociedade, na política, na propaganda, no mercado financeiro e na religião. Para realmente pensar, e deixar de ser apenas “pensado”, é preciso focar no desenvolvimento da individuação e se tornar autoconsciente.
E ainda nos perguntamos, “quem somos nós”? A pergunta fica, mas a resposta não vem enquanto não olharmos em outra direção. Nenhuma resposta vem da própria pergunta. E esta pergunta está embutida no pacote do senso comum, portanto, não encontraremos resposta dentro dele. Cada ser humano que se individualiza e se torna autoconsciente começa a andar na direção oposta ao senso comum e, por essa via, se encontra na direção das respostas aos seus questionamentos. É neste ponto que a própria vida se manifesta, oferecendo caminhos distintos.
A vida responde aos vivos, aos despertos; aos que dormem, ela oferece sonhos. Contudo, os sonhos são mensagens da vida para os “mortos-vivos”. Aquele que decifra sua linguagem também despertará e se perguntará: “O que estou fazendo nesta caverna escura, vendo apenas sombras projetadas por um feixe de luz que entra por uma fresta?”.
A vida é livre, mas quem quer ser livre? Afinal, a prisão oferece mais segurança, e a caverna protege mais do que o campo aberto da vida e da consciência. É espantoso constatar que o ser humano prefira a prisão à liberdade, mas não há exagero nesta afirmação – basta observar ao redor.
Quem é, de fato, livre? Aquele que apenas pensa que pensa ou aquele que se nega a ser “pensado”? Aquele que fura a bolha do senso comum, tornando-se um rebelde, ou o que se acomoda e acredita ser livre dentro dela?
Mas a rebeldia pode ser inteligente ou tola. A rebeldia inteligente é aquela que abre caminho para o indivíduo manifestar sua liberdade e realizar seu “si mesmo” (Self). Em contraste, a rebeldia tola é a do indivíduo que apenas se volta contra as paredes da prisão, batendo a cabeça nelas e acreditando que vencerá o sistema com meras revoluções políticas.
Toda mudança genuína vem de dentro para fora. A troca de um regime por outro, de um sistema coletivo por outro, é apenas uma transferência. Enquanto a mudança interior não ocorrer, o indivíduo apenas trocará uma prisão pela outra, sem se livrar da pena que aceitou cumprir por covardia e medo de ser si mesmo, de assumir sua individuação e de se autogerir por meio do conhecimento de si.
A escolha fundamental, portanto, se impõe – permanecer como “coisa pensada”, olhando confortavelmente para as sombras projetadas nas paredes da caverna, ou abraçar a árdua e vertiginosa liberdade do campo aberto da vida e da consciência. A jornada da individuação não oferece garantias, apenas a promessa de um pensamento autêntico e a possibilidade de se tornar, finalmente, gestor da própria existência. A escolha entre ser um eco seguro e uma voz singular é, em última análise, o que define a essência da experiência humana.